Deitada e olhando pro céu. Com a
vista turva, pela luz que ofusca. Ela não queria parar de olhar. Olhando
diretamente para o sol, até poder ver a enorme bola alaranjada que se forma e
que, depois dela, nada mais se pode ver. Já tinha feito isso antes. Mas jamais
havia sentido algo igual. Por entre as folhas da enorme mangubeira. Folhas que
iam e vinham, levadas pela suave brisa daquela manhã. Manhã como tantas outras
que viveu, como tantas outras que viveria, mas diferente porque nunca foi
esquecida. Dentro da enorme bola de sol uma esperança, uma sensação de paz
presente e futura, de perspectiva do que viria, com a certeza de que viriam
coisas boas enviadas pelos anjos de Deus.
Naquela manhã de conhecimento, de
estudo, de solidão, de certa forma não se tinha nenhuma perspectiva, nem haviam
sido criadas quaisquer expectativas. Era apenas mais um dia, comum, mas
daqueles que marcam. Ali deitada embaixo da árvore, sem falar, sem pensar, sem
se importar somente tentado ser tão leve e livre quanto o vento que mexia as
folhas, a única pretensão era a entrega total da alma e do coração a Deus. Ali,
naquele momento, mais que orações, pedidos, agradecimentos, o que de fato se
deu foi a simples e verdadeira entrega. Entrega de um coração que batia nos
seus quinze anos de vida. Cheio de verdades, de incertezas, de inseguranças, mas
também carregado de esperança, de fé na vida, nas pessoas, na verdade.
Ela não sabia ali o que estava
por vir. Aos quinze anos, ninguém sabe. Mas o sonho e a vontade que existiam
ali, também existem aos trinta. A acompanharam, os sentimentos nela colocados
pela conversa que, naquele dia, ela teve com o sol. Talvez seja injusto tentar
explicar em palavras, porque elas não são capazes de traduzir emoções. Mas não
custa tentar, até porque neste caso a busca não afeta o que já se tem. E o que
se conseguiu sem qualquer pretensão foi acreditar que estamos neste mundo
apenas para um único fim: não desistir jamais de amar.
Muitas foram as tormentas que
vieram antes e vieram depois. Ela não tinha idéia, naquela dia, que enfrentaria
nos anos que viriam seus maiores desafios: a luta contra sua própria descrença.
Foram dias de luta, de erros, de acertos. Ela se distanciou de Deus, se
distanciou do sol. Se voltou para dentro. Achou saber como deveria agir para
sair ilesa de um mundo terreno de injustiças e tristezas. Pensou no escuro,
viveu nele. Se aborreceu, deixou de ter esperança. Deixou de ter fé. Mas em
nenhum momento esqueceu do dia em que sentiu sua alma lhe dizer: voa, voa
menina, ame a natureza porque ela ama você.
Não importa o quanto ela tenha se
perdido nesse labirinto que é viver. Não importa o quanto ela errou, se
arrependeu, erraram com ela. Não importa se ela vacilou em se autoconhecer, se
deixou de lado o sentimento e deu azas apenas a razão. Não importa, pois não
importa o quanto ela se afaste de sua essência, pois a essência dela jamais a
deixará seguir sem se mostrar, sem se reconhecer.
Nesses dias nublados, em que
qualquer prazer serve, pois alivia e traz consolo, ela novamente olhou para o
sol. Descobriu que de uma enorme bola alaranjada, foram feitas duas
esverdeadas. Percebeu que o tom dourado que emociona, se materializou em pelos
que cobrem o corpo mais lindo já visto por ela. Foi amor, é amor e onde há amor
sempre irá também se superar.
Ainda está ela, lá, as vezes se
sentindo sozinha. Ainda está ela, lá, as vezes sem fé. Mas não existe mais ela
sem sentir amor. Não existe mais ela sem sentir o calor. Nesses dias em que
tentamos em vão explicar porque tudo está tão diferente, estranho,
apocalíptico, nada mais importa à sua razão, pois algo de tão imenso tomou
conta de seu coração. O amor. Retomando ao início do que aprendeu no dia
embaixo da árvore: único fim para o qual estamos vivos. E Ela está, e assim
permanecerá e assim dará frutos, graças a inexplicável aparição do amor,
materializado naquela que ama e que não se explica, apenas a enche de fé e a
faz querer continuar!
Faltam nove dias para um dia muito especial...um dia em que as cerejeiras irão florescer...um dia em que comemorarei o seu nascer.